Osório
e sua cultura exemplar
Por
conta de algum daqueles acasos da vida que nos levam a lugares que nunca
imaginamos sequer parar, fui trabalhar em Osório. Não tinha nenhuma ligação com
a cidade, ela só me pagava o salário. Nem família, nem amigos, nada. Quando
comecei a circular por suas ruas não conhecia ninguém, não sabia nada sobre o
lugar. Aos poucos, por força da profissão, fui me aproximando das pessoas, da história
da cidade e de seu meio ambiente. Atualmente, estou tão envolvido ao município
que passei a admirar muito tudo que envolve a cidade. Como fui ciclista e um
militante em favor da bicicleta como modal de transporte urbano, logo me chamou
atenção a quantidade de ciclovias espalhadas pela cidade. Mesmo onde não há
ciclovia, as vias são bem cicláveis e agradáveis de pedalar. Outra coisa que é extremamente positivo na
cultura local é o respeito aos pedestres, as faixas de pedestres são
respeitadas! Os carros realmente param quando percebem alguém com intenção de
atravessar a rua. Cadeirantes e cegos também tem vez, as esquinas tem rampas de
acessibilidade e as calçadas tem piso tátil. Há um esforço do poder público
também para estimular as artes. Ontem pela manhã, as crianças da escola
assistiram uma peça de teatro na câmara dos vereadores e hoje à noite vai ser
eu que vou usufruir desse prazer, conforto público e gratuito. Fantástico, uma pequena cidade do interior gaúcho
que aparenta ser norte da Europa. Muito desenvolvida. O meio ambiente também é
valorizado, talvez porque a cidade está encravada entre um cordão lagunar de
águas doces, algumas ainda potáveis, o começo da mata atlântica, com encostas de
serra cobertas de florestas e o mar. O cidadão de Osório tem acesso ao ambiente
natural com facilidade. Todos os cidadãos estão em paz na cidade, “de boa”,
expressão que aprendi lá.
Trabalhando
nas escolas do município, aprendi o hino de Osório. As crianças são ensinadas
desde cedo a cantá-lo e o fazem com entusiasmo, principalmente o refrão. Como
já aprendi a letra depois de velho, demorei a entender sua filosofia, completamente
diferente de qualquer outro que aprendi na infância. Se prestares atenção nas
letras dos hinos de outros lugares ou instituições, verás que são agressivas ameaças.
Os hinos geralmente falam assim: ó, a gente é legal, moramos num lugar
bonitinho, tem umas plantinhas aqui e um por do sol bacana, daí vem a parte que
interessa, mas quem ousar invadir nosso território, um tiquinho que seja, vai
tomar um pau!!! “Mas, se ergues da justiça a clava forte, verás que um filho
teu não foge à luta, nem teme, quem te adora, a própria morte”, diz, sutilmente,
o hino nacional brasileiro. “Mostremos valor, constância, nesta ímpia e injusta
guerra; sirvam nossas façanhas de modelo a toda a terra”, fala o rio-grandense,
já nada delicado. O hino francês é ainda mais explícito: “Às armas, cidadãos!
Formai vossos batalhões! Marchemos, marchemos! Que um sangue impuro banhe
nossos campos!” São lindas composições, emocionantes, mas refletem a ideologia
dominante no tempo em que foram escritas. Sempre é através da guerra que se
chega à paz. A glória da vitória parece ser o valor mais importante, sempre
aparecem essas palavras, olhe nos hinos de times de futebol brasileiros. Se eu
for escrever o hino da minha casa num dia ruim de brigas com os vizinhos que
põe som alto, vai sair coisa bem parecida. Quem escreve os hinos é alguém pequeno,
triste, angustiado, com medo de ser ou mesmo já tendo sido roubado ou
violentado, se fala muito em justiça nos hinos. Por isso chama a atenção o hino
de Osório, que também fala de guerra, nem podia ser diferente porque até o nome
da cidade vem do patrono da cavalaria, mas é diferente em essência: “onde a paz
combate a guerra”. Através da paz e do amor que se percebe a possibilidade de evitar
a guerra. Além disso, admite transitoriedade, fala mais ou menos assim: ó
pessoal, nem sempre foi assim, agora tá assim, mas pode mudar, sei lá... “Mesmo
que mudem divisas, será conservada a memória, ainda que mais se divida, Osório
é marco da história!” É incrível a diferença, quem escreveu estava tranquilo, “de
boa”, feliz, seguro de si. Eu me pergunto: será que o hino é assim porque o
povo de Osório anda de bicicletas e vai ao teatro desde pequeno ou é o
contrário, o povo respeita faixa de pedestre por que pensa e escreve assim? Não
sei, sei que a combinação é boa.
Mas
claro, essa cultura de paz da cidade, sempre pode melhorar. Tem tão poucas
árvores nas calçadas de Osório, poderíamos plantar mais. Poderíamos tomar o
exemplo do hino e em vez de ensinar o ódio, a vingança e a guerra, podíamos
ensinar o amor, a empatia, o envolvimento com a natureza e a solidariedade. Que
tal ensinar sobre alguns filósofos famosos na sua luta pela moralidade das
sociedades. Que tal São Francisco e sua oração “onde houver ódio que eu leve o
amor, onde houver discórdia que eu leve a união”? Que tal Jesus e seu “amai-vos
uns aos outros”? Em vez de ensinar competições nas escolas, poderíamos ensinar
a cooperação. Em vez de promover eventos esportivos, podíamos promover eventos
cooperativos. Que tal Kant e seu “não faça para o outro o que não gostarias que
fizessem para ti”? Alguém são, “de boa”, não gostaria de impor derrota a
ninguém. Tenho certeza que em Osório o povo está preparado para entender esses
ensinamentos. Vamos fazer brotar a cultura da paz e do cuidado uns com os
outros e com a natureza. Vamos tornar a cidade um exemplo internacional de paz
social. Eu, como professor de Educação Física e religião, ateu, estou tentando.
Senhor, fazei-me instrumento da vossa paz.
"Hino de Osório"
(Lei Municipal nº 3.120, de 14.12.99)
Letra: Osvaldo Vieira de Aguiar
Música: Loreno José dos Santos
Braços abertos aos pontos cardeais
E tendo o Sul à esquerda do peito
Na encosta da serra, margeando o mar
Está aqui o lugar que é perfeito.
Ao sopro suave da brisa nordeste
CONCEIÇÃO DO ARROIO, o princípio
Da Vila, na ESTÂNCIA DA SERRA
Que a OSÓRIO passou a município.
Mesmo que mudem divisas
Será conservada a memória
Ainda que mais se divida
OSÓRIO é marco da história
Alto dos morros com visão natural
Pairando qual pássaros no vôo a vela
Espelham lagoas e seu manancial
Geografia divina, repleta e bela.
Esta cidade é mesmo um encanto
Que integra a nação brasileira
Cintilam verde, vermelho e branco
No tremular de nossa bandeira
Refrão...
Onde a paz combate a guerra
Se conserva em harmonia
Lembrando ilustre filho da terra,
Osório, o patrono da cavalaria.
Refrão... ( 2 x)
"Hino de Osório"
(Lei Municipal nº 3.120, de 14.12.99)
Letra: Osvaldo Vieira de Aguiar
Música: Loreno José dos Santos
Braços abertos aos pontos cardeais
E tendo o Sul à esquerda do peito
Na encosta da serra, margeando o mar
Está aqui o lugar que é perfeito.
Ao sopro suave da brisa nordeste
CONCEIÇÃO DO ARROIO, o princípio
Da Vila, na ESTÂNCIA DA SERRA
Que a OSÓRIO passou a município.
Mesmo que mudem divisas
Será conservada a memória
Ainda que mais se divida
OSÓRIO é marco da história
Alto dos morros com visão natural
Pairando qual pássaros no vôo a vela
Espelham lagoas e seu manancial
Geografia divina, repleta e bela.
Esta cidade é mesmo um encanto
Que integra a nação brasileira
Cintilam verde, vermelho e branco
No tremular de nossa bandeira
Refrão...
Onde a paz combate a guerra
Se conserva em harmonia
Lembrando ilustre filho da terra,
Osório, o patrono da cavalaria.
Refrão... ( 2 x)
És um exímio observador e escreves com propriedade e maestria. Parabéns!
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