Historietas
Nós
fizemos outra greve este ano, durou oito dias, mas não vamos ter que pagar em
dias como no ano passado. Nosso sindicato fez um bom acordo e uma das cláusulas
dizia que pagaríamos os dias parados em conteúdos, o pessoal da educação, e em
atendimento, o pessoal da saúde, até o final do ano. Eu participei do movimento
ativamente, como sempre faço. Quanto mais velho e gordinho fico, mais sedutor
me pareço, juro, é verdade. Como já fui de muitas unidades de ensino na rede,
sempre fui conselheiro do sindicato e já falei em muitas assembleias, mal eu
chego numa nova unidade para trabalhar no começo do ano e a conselheira titular
já abre mão do posto a meu favor. Este ano aconteceu de novo. Não sei explicar
bem porque, mas estou me tornando não mais um, mas "o" agente
mobilizador da categoria. Algumas pessoas já vieram me falar isto textualmente:
que eu é que decido se vai haver greve, quando ela começa e quando ela acaba.
Fico sempre bem nervoso quando vou falar o que acho da situação nas assembleias,
afinal tem sempre umas três ou quatro mil mulheres (e uns trezentos homens) me
olhando, minha fala sai meio gritada e o pessoal entende como eloquência. Sou
interrompido durante minha fala para ser ovacionado e depois as pessoas ficam
me seguido nas passeatas, me dando tapinhas nas costas, dizendo que votam em
mim para qualquer cargo que me candidatar e arremedando alguma fala minha
tentando imitar o meu sotaque gaúcho: "- ...O VERDADEIRO SIGNIFICADO DA
PALAVRA DIGNIDADE!" O pessoal da diretoria do sindicato vem me agradecer e
elogiar a minha fala. Nas reuniões do conselho deliberativo antes das assembleias,
todos querem saber o que eu vou dizer, existe um temor que eu discorde de
alguma coisa, como já aconteceu. Depois de decidir um encaminhamento alguém
comenta em voz alta, meio nervoso: "- Só falta o Tiago dizer para
base...". Mesmo eu sendo só mais um peão da base da categoria a maioria já
me percebe como o grande e sensato líder. O pessoal dos partidos ficam me
sorrindo e me convidam para reuniões políticas. Ao mesmo tempo, outros que eram
amáveis, fecham a cara e me olham como principal opositor ou concorrente,
apesar de eu não ser candidato a nada, nem a diretoria do sindicato. Devem ser
os cabelos brancos, as cãs, como diz minha mãe. Me tornaram mais probo, apesar
de eu ainda ser aquele mesmo ribeirinho de sempre. Acho que se me candidatasse,
coisa que não vou fazer nunca, eu também votaria em mim.
Agora
é tempo de eleições para vereador e prefeito aqui no Brasil. O nosso sindicato
dos servidores da prefeitura de Florianópolis lançou vários candidatos à
vereança. Nenhum sou eu, ainda bem. Mas eu estava apoiando um do PT, só para
não deixar de agir politicamente, cheguei a vender convites para o baile em
favor da campanha dele lá na creche. Depois percebi que outro "companheiro"
de sindicato, bem mais sensato, saiu pelo PC do B. Fiquei sem jeito de trocar,
então somente sai de fininho da campanha oficial e estou fazendo campanha
informal, boca em boca e ao pé do ouvido, para os dois. Até na cidade vizinha
de São José (parece nome de cidade mexicana, né?), uma Viamão daqui, tem
candidatos do nosso sindicato. Incrível é que o candidato a prefeito pelo PSTU
de lá é funcionário efetivo da prefeitura daqui. Ele é muito engraçado, não
porque conta piadas, mas pela forma como se apresenta. Está sempre de coletinho
preto solto sobre o tronco nu, raspa os cabelos, tem tatuagens de surfista nos
ombros, é bem orelhudo e usa uns brincos de argolinha na ponta do lóbulo. No
debate da TV, assisti para cumprimentar ele depois, no meio dos engravatados
ele só fazia denunciar os grandes banqueiros internacionais e seus planos
capitalistas para explorar o povo de São José. Eu mesmo nem sabia que São José
era tão importante! Segundo o candidato, um verdadeiro fulcro de interesse do
capital mundial. Ele foi o centro das atenções no debate, claro. O PSTU é um
partido muito engraçado mesmo, no debate aqui de Floripa, o candidato deles nem
foi convidado porque o partido não tem sequer um representante no congresso
nacional. Lá em São José eles fizeram aliança com o PSB e só por isso nós
tivemos que ouvir o nosso orelhudo companheiro xiita careca na TV. Mas ele não
é o único candidato esquisito das eleições.
Aqui
na minha rua, numa casa antiga de esquina, tem uma tal Farmácia do Rafael. Tem
um aspecto tão horroroso que quase ninguém entra na tal farmácia. Mas tem uma
balança, bem a vista na porta, daquelas antigas de pesos em pêndulo. Todo mundo
se atrai para a farmácia velhona com nome boboca para subir na balança na
ilusão de se pesar. O ponteiro da balança leva umas duas horas para parar
quieto. E quando está quase parando tu tens que respirar e ele recomeça a
oscilar. Eu logo desisti de usar a tal da balança, é inútil, depois de vinte
minutos tu sais com a informação de que estás mais ou menos entre 75 e 105kg. O
atendente da farmácia é um baita gordão, fica atrás de ti, apoiado no gasto
balcão, respirando alto, só olhando, não fala nada, é a curtição do dia dele
ver alguém tentar se pesar ali. Pois não é que até o atendente sacana da
Farmácia do Rafael resolveu se candidatar. Ele escolheu o PRP, um partido
daqueles para quem não tem a menor idéia do que seja política, mas quer entrar
nesta onda por que sabe que dá dinheiro. O nome dele é Alvimar. Temeroso de que
houvesse muitos alvimares se candidatando, afinal é um nome bem comum, quase um
João, ele resolveu especificar: Alvimar Gordinho. Ainda assim, achou que não
ficava bem claro, poderia alguém se confundir de alvimar gordinho, Talvez uns
três ou quatro alvimares gordinhos candidatos na eleição de 2008 na cidade de
quatrocentos mil habitantes. Então, finalmente, o nome do candidato ficou:
Alvimar Gordinho da Farmácia. Além de tudo ele é vesgo e usa óculos fundo de
garrafa. Que espetáculo de candidato. Acho que vou votar no Alvimar!
Aqui
na grande Florianópolis, além de candidatos esquisitos, tem uns pichadores
engraçados. Lá em Porto Alegre tinha o Toniolo, lembra? Pichado em tudo que é
muro ou monumento da cidade: TONIOLO, um bem grande, ou pequeno repetido várias
vezes. No tempo em que se votava escrevendo numa cédula nas eleições, muita
gente votava no Toniolo para o que fosse: Deputado? Toniolo. Vereador? Toniolo.
Prefeito? Toniolo. O cara era um maluquinho conhecido pichador da cidade, mas era
tanta propaganda do Toniolo que as pessoas só imaginavam um uso para o nome,
queriam votar no irresponsável candidato vândalo, sem saber que era um pichador
maluco. Talvez fossem os punks que votavam no Toniolo, a esperança é a última
que morre, mas o tal do pichador Toniolo tinha sempre uma expressiva votação.
Aqui não tem o Toniolo, mas por toda a cidade, inclusive bancos de ônibus,
ponte Hercílio Luz, prefeitura, escolas, guaritas de salva-vidas, terminais de
ônibus, viadutos ou em qualquer parede desavisada, está lá, orgulhosamente
pichado, três iniciais. Parece o símbolo de alguma tribo, como o MTZ da antiga
gangue da praça da matriz lá de Porto Alegre, nem sei se ainda existe. Mas não
é MTZ que aparece aqui em Floripa, as três iniciais são outras, me parecem bem
familiares, na primeira vez que vi quase cai para trás de susto. Aqui, as três
letras pichadas são: T. M. A.. Minha oficina de bicicletas tinha este nome: TMA
bicicletas de alta performance. Mas não fui eu que pichei, juro! As vezes é só
TMA, as vezes tem uns desenhinhos ao lado. Então, sei lá quem é o tal do T. M.
A., mas simpatizei com ele, acho que vou votar neste cara.
Agora
nas férias de julho fui viajar com a namorada. Fomos plantar umas árvores num
terreno que ela tem na praia de Itapiruba, no município de Imbituba, a uns cem
quilômetros daqui. Itapiruba é aquela praia que não tinha nada além de uma vila
de pescadores artesanais, até que construíram um hotel enorme de frente para o
mar. Tão grande era o hotel que dava para ver da BR 101. Tão grande mesmo,
completamente desproporcional ao vilarejo, que quebrou, foi abandonado e
saqueado em tudo que não fosse tijolos e reboco. Agora é um esqueletão no meio
do campo. Bom, continuando, depois de plantar fomos para a posada, largamos
nossas coisas e saímos para caminhar na praia. Caminhamos para o norte e sem
querer fomos dar em frente ao prédio do Projeto Baleia Franca. Nenhum de nós
dois sabia da existência de tal instituição ali e só a percebemos porque tem
uma enorme baleia de fibra de vidro na frente. Na porta dizia o horário: até às
18 horas. Já tinha passado dez minutos das 18, então ficamos redemunhando na
porta, combinando de caminhar até ali no outro dia pela manhã. Mas eis que
alguém abre a porta e pergunta se a gente quer entrar. Entramos, foram super
gentis conosco, assistimos a um vídeo da baleia franca, como elas tinham sido
dizimadas até não sobrar uma no Brasil e como agora elas estavam voltando.
Depois nos ensinaram coisas e mais coisas das baleias, com muita boa vontade e
disposição, finalmente nos orientaram onde era o museu da baleia franca e onde
elas poderiam ser avistadas. Nós achamos aquele papo todo lindo, mas aquele
negócio de ver baleias parecia ser muito distante e difícil. A ficha não tinha
caído ainda. Baleia só pela TV, na Antártida. Saímos do prédio só às sete da noite.
Como
tudo era ali pertinho, no outro dia tocamos para o centro de Imbituba, conhecer
o museu. Nós não estávamos nos dando conta da real possibilidade de ver mesmo
as baleias. O museu era todo sobre a matança e como elas foram dizimadas ao
longo do tempo. Muitas fotos e histórias, muitos arpões e caldeiras onde a
graxa se transformava em óleo. Achei legal a história de que os cidadãos de
Salvador não gostavam de baleias, elas eram tantas por lá que não deixavam
ninguém dormir tal era a algazarra que faziam na água, cantando e dançando
noite adentro. O museu era na última estação baleeira do Brasil, que só foi
fechada em 1973 porque não tinha mais nenhuma baleia no litoral. As baleias
eram o petróleo da época, proporcionaram a energia necessária para o desenvolvimento
das cidades. Usavam o óleo em espiriteiras para cozinhar, em lanternas para
iluminar e como material aglutinante na argamassa para construções. Usaram até
a última gota! A atendente do museu foi também super gentil e solicita, como as
gurias do projeto e de novo nos estimulou e orientou onde poderíamos ver as
baleias, vivas, no seu habitat natural, nadando, pulando, namorando,
amamentando. Ficamos meio sem jeito de não ir ver o lugar onde elas todas
estavam nos indicando. Ainda pensamos se íamos almoçar no centro primeiro ou se
íamos conhecer a praia. Decidimos tocar para a praia da Ribanceira antes do
almoço, afinal eram só uns instantinhos para constatar que não dava para ver
mesmo. Além de tudo estava muito frio e ventando forte. Fomos mais para matar o
tempo de férias, conhecer uma praia que ainda não conhecíamos. Ninguém da nossa
geração acreditaria que realmente veria uma baleia viva no seu ambiente
natural. Estacionamos o carro no fim da praia, ao lado do costão, e começamos a
subir caminhando a trilha que levava ao mirante natural. No meio do caminho
encontramos alguns turistas descendo a trilha. Perguntei, debochando: E aí
pessoal, está dando para ver as baleias hoje, ou não? Para minha grande
surpresa eles disseram: Tá dando, mas bem de longe, da para ver elas se mexendo
na água. Só aí caiu a ficha, eu realmente poderia ver uma baleia. Eu já atravessei
o oceano de navio, moro há seis anos em Florianópolis, passei a infância
veraneando na beira daquele mesmo mar, já vi montes de pingüins e golfinhos,
lulas, polvos, peixinhos e peixões, cardumes inteiros e até tartarugas gigantes
nadando livres. Mas baleias nunca. Subi meio correndo, esbaforido, lá em cima
não tinha ninguém, só o vento zunindo. Olhei em todo o entorno do costão, nada
de baleias, só quinhentos surfistas, voltei e ajudei a namorada a subir a
última pedra até o mirante. Sentamos ofegantes, meio desapontados num banquinho
de madeira que tinham colocado ali para observação. Agora com mais calma, mas
ainda suados, fizemos mais um giro com o olhar em toda a vastidão. Neste
instante, trinta segundos após nossa chegada ali, ao longe, vi uma baleia
saltar para fora d'água como num documentário da BBC. O corpo inteiro, gigante,
todo para fora d'água, mesmo àquela distância podia ser visto com detalhes. Não
é possível escrever com precisão a emoção que senti naquele momento. Com um
grito de alegria, apontei para minha namorada onde estava e ela ainda viu o
corpo caindo, esparramando água. Um misto de choro e riso descontrolado se
seguiu. Eu pulava e gritava de prazer, sem tirar os olhos daquele pedaço de
mar. Mais quinze segundos e outra baleia pulou também, no mesmo lugar, com a
mesma magnífica exuberância da primeira. Este foi um dos momentos mais felizes
da minha existência. Em um minuto de observação já tínhamos testemunhado dois
saltos maravilhosos, pensei que teríamos um festival de baleias saltando.
Ficamos mais uma hora e meia ali, até começar a tiritar de frio. Não vimos mais
nenhum salto grandioso, mas vimos saltitos de filhotes, rabos, dorsos, cabeças,
barbatanas e borrifos. Vou ver se não tem ninguém do Projeto Baleia Franca para
votar.
Em
março foi uma equipe das pequenas obras da prefeitura consertar um muro da
creche que estava caindo e, ao saírem, deixaram toneladas de madeira, sobras da
obra. Folhas de compensado, escoras de eucalipto, tábuas e ripas, tudo ficou
ali, atirado. Juntei para as crianças não se machucarem e guardei tudo no
subsolo. Então, nestas férias, me deu uma louca, além de plantar árvores e ver
baleias, também dei uma de carpinteiro: Construí uma casinha na única árvore lá
da creche. Ficou bem legal, mas não sei se vai agüentar o tranco da gurizada
toda em cima. De um lado tem uma teia de cordas para subir, de outro tem uma
rampa, e embaixo tem até quadro negro para desenhar. Acho que a construção
desta casinha foi uma das maiores realizações da minha vida!
As
gurias do quadro civil (é assim que chama mesmo, civil, eu sou do quadro do
magistério) que ficam na creche durante as férias, não entendiam porque um professor
estava ali. Trabalhando ainda por cima! Bom, enquanto eu estava lá fora
trabalhando na casinha, as gurias da limpeza ficavam lá dentro limpando e
limpando e limpando, nunca vi tanta limpeza. Uma manhã elas me chamaram:
precisavam de ajuda para carregar um móvel velho que iria para o lixo. Estava
sendo usado para armazenar os sacos de lixo de todos os tamanhos possíveis e
imagináveis na lavanderia. Um novo armário tinha chegado e aquele não era mais
necessário. Ajudei. Coloquei na rua o troço e na luz vi bem o que era. Um
antigo arquivo de documentos, feito de madeira bem escura, daqueles com uma
abertura corrediça, que desliza e vai se escondendo da frente para trás do
móvel, fazendo uma curva por cima. Atrás uma etiqueta de papel do fabricante dizendo
a data: 1964. Me apaixonei pelo negócio. Antigamente aquilo era o que havia de
mais moderno, era o computador da época, onde se guardavam os documentos da
repartição, empresa ou, no nosso caso, escola. Só tinha quatro prateleiras das
10 originais, mas a abertura funcionava perfeitamente e não tinha um cupinzinho
sequer. Diante do meu entusiasmo as faxineiras procuraram e acharam no depósito
as outras prateleirinhas. Telefonei para diretora e pedi de presente, já que ia
para o lixo. Ela então disse que tinha mais gente interessada no móvel, mas que
depois conversávamos. No outro dia ela esteve lá e eu fui pedir de novo. Ela
então chamou o outro interessado. Pensei que fosse alguém da secretaria da
educação, ou alguma outra professora da creche, alguém que compreendesse o real
valor e utilidade daquele objeto. Mas não, o outro interessado era o único
homem além de mim que trabalha lá, um dos faxineiros. Ele queria para por as
roupas e coisas do filho recém nascido. Fiquei super sem jeito: eu, um
professor que, aos olhos dele e das outras faxineiras, ganho super bem, moro
sozinho e, acima de tudo, pedi o móvel depois dele, como poderia reivindicar
algum direito sobre aquele lixo. É evidente que ele merecia mais o móvel que
eu. Então tive a idéia: compro outro móvel, para roupas de criança mesmo,
topas? Sim, claro! Aos olhos dele ele estava ganhando um móvel novo do nada.
Aos meus olhos eu estava trocando um pote de ouro por uns espelhinhos e
miçangas. Me senti um usurpador, me aproveitando da ignorância do cara. Mas
tendo a diretora como mediadora do acordo e umas cinco faxineiras de
testemunha, saímos todos satisfeitos. Fui correndo para o centro e na mesma
tarde visitei todas as lojas da cidade que vendem móveis. Comprei, em dez
prestações, o primeiro que achei com as características que o cara pediu.
Fiquei feliz, ele também. Meu móvel é lindo, soquei dentro do carro da diretora
para trazer para casa. O dele a loja ia entregar e montar em casa.
Teve
um dia que saí com a turma do G4 (eles tem em média três anos de idade),
correndo porta afora para o pátio. Chegando lá estava garoando, então chamei
todo mundo de volta. Ninguém me atendeu, estavam todos agarrados na cerca,
olhando um arco-íris. O troço estava perfeito, o mais perfeito, inteiro e
nítido que já vi na vida. Começava no campinho atrás da creche e terminava
atrás de uns prédios da vizinhança. Ficamos todos mudos olhando até o arco se
desfazer, mesmo nos molhando um pouco na chuvinha. Eles embasbacados, sem
entender direito o que era aquilo. Eu emocionado, não só pelo espetáculo do
arco-íris, mas pelo tanto que aquilo os fez parar, como se fosse uma baleia
saltando, um verdadeiro espetáculo da natureza. Agora já sei, com precisão,
onde cavar para achar o pote de ouro. Fomos para sala e contamos para professora.
Então sentamos todos pelas mesinhas para registrar aquele momento, pintamos em
tela o arco-íris. Claro, o único quadro que ao final da atividade lembrava um
arco-íris era o meu. Mas fizemos todos, orgulhosos de nossa produção, uma
grande exposição no corredor. Difícil foi convencer depois as outras
professoras de que eu não pintei um símbolo gay, mas sim um simples fenômeno
natural. A gozação foi generalizada. Foi só mais uma ótima manhã no escritório.
Passados
alguns meses, descobri o que a sigla “T.M.A.” pichada pelos muros da cidade
quer dizer. Foi engraçado. Estava falando com o Ademir, o porteiro da tarde
aqui do prédio, lá na frente do condomínio. Ele esperava ansioso o reinício do
jogo de futebol que estava no intervalo. Seu time do coração estava jogando,
então o rádio estava bem alto na guarita. O Ademir me contava que o Avaí estava
para subir para primeira divisão, que gostava de ir ao estádio ver os jogos,
mas que geralmente estava de plantão na guarita. Assim mesmo, ele paga, com seu
micro salário, uma contribuição mensal para o clube e para a torcida organizada
de que é sócio: a Torcida Mancha Azul. Ele abriu os botões do uniforme do
condomínio e me mostrou, orgulhoso, a camiseta azul oficial da torcida que
vestia por baixo. Estava lá, bem grande, em cima do desenho de um leão
irritado: T.M.A. Ah! Então são vocês os vândalos! No intervalo do meio do jogo,
os caras da rádio ficam fazendo alguma entrevista para encher lingüiça. Um dos
repórteres falou: “Agora vamos ouvir o que o juiz Vladierrisson, do Ceará, está
falando para os jogadores no centro do gramado antes do reinício da partida:”
Imagino eu que o repórter veio por trás do juiz e o vladierrisson não percebeu
que estava sendo gravado, porque ele dizia: “olha qui, seus viado, não quero saber
daquela putaria do primeiro tempo, heim?” O repórter muito sério e
compenetrado, rapidamente esclareceu: “Taí, então, estas foram as instruções do
juiz Vladierrisson da Silva, do Ceará, aos jogadores para o reinício da
partida!”
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