Jesus
Jesus
catou os apóstolos entre os trabalhadores. Ele rapidamente os conheceu bem
porque conviveu muito com eles. Caminhavam, caçavam, pescavam, colhiam,
cozinhavam e comiam juntos, até dormiam juntos pelas estradas. Era uma vida
dura de muita pobreza, mas não muito diferente daquela que os apóstolos estavam
acostumados antes de encontrar Jesus. Cada apóstolo tinha uma qualidade, mas as
que quero fazer referência hoje são as qualidades de Judas e de Simão. Jesus
viu logo que Judas era o mais inteligente de todos e confiou a ele todo
dinheiro do grupo, Judas saberia administrar bem. Judas também era o que melhor
compreendia as implicações políticas das palavras de Jesus, de modificação do
mundo, era seu braço direito. Jesus confiava muito nele, sempre planejavam
juntos a estratégia de disseminação da palavra, aonde iriam e o que fariam para
passar suas idéias. Já Simão era o que acreditava e confiava mais nas coisas
que Jesus falava, era o que tinha mais fé. A fé de Simão era inabalável, ele
acreditava mais naquelas idéias que o próprio Jesus. Então Jesus disse que ele
seria a pedra sobre a qual construiriam sua igreja. Jesus não quis dizer igreja
no sentido de templo, de prédio de tijolos e argamassa, mas igreja no sentido
de arcabouço de idéias, no sentido do conjunto de pessoas que acreditavam nas
mesmas idéias, igreja no sentido das pessoas que são fiéis àquelas idéias, que
professam a mesma fé. Jesus quis dizer que a igreja, aquelas idéias, deveriam
ser sólidas e inabaláveis como uma pedra, como a fé de Simão, por isto ele
disse que Simão se chamaria Pedro.
Muitas
vezes, durante as longas viagens a pé, Jesus e os apóstolos paravam em algum
lugarejo para descansar e beber água. Os lugarejos eram pobres, seus moradores
subsistiam como dava com uma pequena roça ou criação. Por onde passavam o grupo
atraia a atenção dos moradores. Naquela época não havia televisão, nem rádio ou
internet, então os viajantes é que traziam as notícias de outros lugares e
todos se aproximavam para escutar. Um grupo grande então, era um verdadeiro
show. Toda vez que paravam, Jesus aproveitava e passava suas idéias para o
povo. Todos ouviam porque Jesus trazia uma boa nova (boa nova é o que a palavra
evangelho significa) e era igual a eles, filho de um carpinteiro, um aprendiz
de carpinteiro, um trabalhador, como eles. Todos os moradores dos vilarejos se
vestiam, falavam, agiam e, provavelmente, fediam como Jesus ou qualquer um dos
apóstolos, eram todos pobres e naquele tempo não havia omo dupla ação nem
desodorante nívea. Depois de descansar, beber e conversar, Jesus ajudava no que
podia e seguia viagem. Jesus e os apóstolos eram viajantes que não estavam só
indo de um lugar para o outro, não levavam mercadorias para vender aos aldeões
ou somente informações, eles levavam idéias para o povo.
O
povo judeu era explorado pelos romanos. Para que as legiões comessem, os judeus
plantavam. Para que os centuriões vestissem, o povo judeu tecia. Para que os
césares se deliciassem com mel o povo enfrentava as abelhas. Para que o império
romano comesse carne, os pobres pastoreavam. O povo judeu sonhava com a
libertação daquela opressão. Sonhava com uma terra onde não seriam feitos
escravos, onde tudo o que plantassem e colhessem fossem deles mesmos. Por isto
que nesta terra o leite e o mel jorrariam, porque toda a produção do povo seria
para eles mesmos e não para pagar algum imposto imperialista. As idéias de
Jesus eram subversivas para a época, iam contra o que os ricos e poderosos
falavam, iam contra até das idéias do próprio povo. Jesus dizia que o povo
pobre e explorado deveria se unir, mas a luta contra os opressores não seria um
levante armado e nacionalista como todos queriam. Jesus dizia que, contra o
opressor e seus exércitos, a vitória seria conseguida através do exemplo de
conduta: solidariedade, amor e comunhão de alimentos, bens e ideais. Todo mundo
deveria dividir sua comida, sua água e até seus bens com qualquer um, mesmo
sendo um desconhecido, mesmo sendo só um mendigo caído na rua, até mesmo se
fosse um opressor imperialista romano. Tudo deveria ser comum a todos, Jesus
era um comunista. Ninguém deveria buscar acumular bens. Se alguém tem mais do
que precisa para viver, teria as coisas de alguém. Se alguém come mais do que
precisa para viver, estaria comendo a comida de alguém. Jesus dizia que isto
não é justo. O que é importante é o processo comunitário de trabalho fraterno
para o cuidado e sobrevivência de todos. Ele pregava a comunhão de tudo, da
terra, da lavoura, da água, da criação, da casa. Todo mundo deveria ter fome e
sede de justiça, amar o próximo. Justiça social: todos merecem um quinhão igual
do esforço da humanidade. Ele dizia que todos tinham que tratar qualquer pessoa
com respeito, com amor, com cuidado. A fraternidade do povo venceria a opressão
e até converteria os opressores em solidários cidadãos. Se todos dividissem com
todos o resultado de seu esforço, não haveria fome, sede ou qualquer outra
privação para ninguém. Eram estas as idéias que Jesus passava por onde
caminhava. Se todos agissem assim, todos seriam salvos e viveriam para sempre
no paraíso. Jesus era bem eloqüente quando falava e as pessoas passavam a
acreditar no que ele dizia.
Naquela
época já era difícil de entender estas idéias de amor ao próximo, de comunhão
de bens e aceitar. Hoje em dia então! Quem para seu carro nos pontos de ônibus
para perguntar se alguém quer carona para o centro? Será que quem tem uma TV de
plasma 42 polegadas deixa quem quiser entrar em sua sala para assistir a
novela? Será que quem vai a um restaurante convida alguém que está com fome
para também participar de seu banquete e se saciar? O fazendeiro
divide a produção com seus empregados? E o industrial? É, ser cristão não é
fácil! Jesus sabia que convencer o povo seria difícil. Ele sabia que, para todo
mundo entender, ele tinha que dar o exemplo. Ele sabia da sua missão. Depois de
muito pensar, ele se reuniu com Judas, o apóstolo politizado e inteligente,
juntos planejaram um ato público para que suas idéias, suas causas, se
tornassem mais conhecidas. Jesus combinou com Judas que ele o entregaria aos
romanos. Judas relutou, mas percebeu logo que era um modo de ganhar muita
visibilidade. As idéias seriam levadas a mais gente e o povo se salvaria. Jesus
relutou, porque era o dele na reta, mas também se resignou com sua missão, ele
sabia que só assim seriam ouvidos para além da palestina. O resto dos apóstolos
nem ficou sabendo do plano de Jesus e Judas, justamente porque eles contavam
com a indignação dos apóstolos pela morte do mestre que motivaria ainda mais os
discípulos para divulgar a palavra. Também ficou claro para os dois, os dois
cabeças do movimento, que mais cedo ou mais tarde eles seriam mesmo pegos.
Jesus aceitou o sacrifício, poderia ter fugido, mas ele queria dar o exemplo de
luta e resistência, de quanto alguém deve se comprometer com a causa do amor ao
próximo. Ele sabia que a partir daí, Pedro e os outros sairiam pelo mundo a
divulgar a boa nova, ainda que ele não estivesse mais lá, e o povo seria salvo.
Os
textos bíblicos foram escritos na sua maioria em aramaico, depois traduzidos
para o grego clássico ou para o latim. Depois traduzidos para o hebraico,
etrusco, alemão, espanhol e destes para o português castiço. Finalmente, para o
nosso português contemporâneo. Nestas traduções muitas coisas foram sendo
perdidas. Cada tradutor tinha uma crença diferente e muitos omitiram coisas,
acrescentaram, modificaram como lhes pareceu mais conveniente. Muitos textos
foram apócrifos, principalmente os que foram escritos por mulheres ou os que as
citavam com a devida importância. Fica na cara de quem lê os evangelhos
apócrifos que Madalena foi esposa de Jesus, assim como muitos apóstolos tiveram
esposas e filhos que os acompanhavam nas viagens. A interpretação dos textos
também foi sendo esmaecida pelo tempo, se modificando. Judas, de grande
estrategista político, virou traidor. Pedro, de guardião da fé nas idéias de
comunhão e amor ao próximo, virou o primeiro papa de uma nova religião que
Jesus nunca teve intenção de criar. Então, o que lemos hoje em dia na bíblia
escrita em português tem que ser cuidadosamente interpretado.
Por
exemplo: Jesus disse que era para dividir o pão e fazer isto em seu nome. O que
ele quis dizer foi que é para dividir o alimento com todos sempre, em todas as
refeições. E, ao fazer isto em todas as refeições, sempre lembrar das idéias de
comunhão de tudo, para que todos se lembrem sempre do que é justo fazer e quão
importante é cuidar das pessoas do entorno, do próximo. Ele não quis dizer: ó
pessoal, toda a semana vocês devem se reunir especialmente num templo, cantar,
rezar, dar uma hóstia para cada um, dizer várias vezes meu nome, me adorar...
Depois cada um vai para sua casa, o pobre para a maloca, o rico para a mansão,
e todos irão para o céu. Não, Jesus não quis dizer isto.
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