terça-feira, 22 de julho de 2014

O gato
Nos últimos anos, Bebel se queixava: É tudo tão difícil! Cada vez que levantava, sofria com as dores nos joelhos. Dava uns passinhos e parava, me olhava nos olhos e exclamava de novo: Que esforço horrível! Para ir ao banheiro era uma tarefa demorada, ainda mais à noite, no escuro. Algumas vezes eu estava na sala, fuçando no computador e a ouvia levantar. Ia lá e oferecia ajuda, conversávamos sobre as dificuldades. Eu a abraçava e dizia que a amava. Ela ria e eu também. Morando sempre longe, primeiro em Florianópolis e agora em Maquiné, eu não podia estar muito perto, mas quando ia gostava de ajudar. Alzheimer tem umas infecções oportunistas, a mãe teve uma pneumonia. Estava tratando e já estava melhorzinha. Naquela madrugada eu não estava e Bebel foi ao banheiro sozinha. Caiu e pediu socorro para a cuidadora da noite. A moça veio e viu que era mais que um simples tombo. Bebel arfava. Chamou o Jacques e os dois decidiram chamar uma ambulância que veio bem rápido. No chão frio, Bebel esperou, mas percebeu que vivia seu derradeiro instante. Suas últimas palavras foram ditas para seu companheiro de cinquenta anos: Eu quero doar. Depois de uma vida de doação, aos filhos, ao esposo, aos pobres, numa Quarta-feira santa, Bebel viveu sua páscoa. Páscoa significa passagem. É a celebração mais importante da Igreja Cristã, da qual ela era fiel. A ambulância chegou, tentaram reanimá-la, judiaram dela com tubos, massagens e injeções, mas já era tarde. Foram embora. O último momento de Bebel foi também difícil, foi também de muito esforço. Desconsolado, Jacques avisa quem pode. Todos vêm rápido. O vigia da rua percebe que, além do movimento da ambulância na aurora do dia, alguém abandonou um pequeno gato algumas casas abaixo e arrancou o carro. O momento é muito triste, a família se reúne impactada. O gatinho começa a miar na rua. Alguém se lembra de procurar uma funerária. O gato mia mais forte e se ouve que pulou o portão e entrou na garagem lá de casa. Atarantadas, minhas irmãs fazem uma lista de pessoas a avisar. O gato, insistente, mia sem parar na soleira da porta da frente. O pai reza sentado ao lado do corpo da mãe que jaz na cama de hospital que ela dormia nos últimos meses. O gato, em desespero, grita na única porta que ouve movimento naquela triste manhã. Betânia, minha irmã do meio, resolve abrir para ver o que há. O gato silencia, entra correndo no hall, da voltas nas pessoas que estavam por ali, se roça no pai e sobe na cama. Para assombro de todos, o gato sobe no corpo da mãe, cheira um pouco, olha para os lados, mia baixinho, desce e sai de casa de novo. Por uns dias ficou por ali pela frente da casa, brincando, até que o vigia resolveu levar para uma filha. Eu, ao contrário de minha mãe, não sou cristão. Não acho que o gato tenha sido um anjo que veio levar sua alma para o céu. Nem sou espírita ou umbandista para acreditar que o espírito dela reencarnou no gato. Cada crença tem uma interpretação diferente do papel do gato. Eu acho que o gatinho estava sozinho, carente, com medo, abandonado. Procurou ajuda e ouviu movimento. Subiu na cama e na mãe porque era ali o foco da atenção de todos. Acho também que a mãe morreu, ela agora só está nos meus genes e memes, mas naquela hora devia estar exalando cheiros muito curiosos para o gato. Fiquem à vontade para interpretar da maneira que mais lhes agradarem, eu só contei a história. Mas que a história é boa, é!
Outra boa história:
Algumas coisas engraçadas acontecem num funeral. Uma senhora, que não me via havia uns vinte anos, me disse: Tu eras tão bonito... O que aconteceu?!!
Ela estava impactada como eu embagulhei tão dramaticamente nesse tempo.
Outra, que nunca eu havia visto, me perguntou: Tu és quem?
Eu respondi: Sou o Tiago, terceiro filho da Bebel.
Ela não entendeu: Bebel quem?
Eu esclareci: Bebel é a Ana Isabel.
Ela queria mais esclarecimentos: Que Ana Isabel?
Eu apontei para a mãe no caixão: Essa ali ó, que a gente está velando.
A Irmã dessa senhora, que é muito amiga da família, estava a seu lado e observava sorrindo aquele papo de louco, sem interferir. E a senhora queria saber mais: Mas quem é essa?
Eu: Bebel é amiga de infância da Verinha.
Ela olha para a irmã e retorna para mim: Então tu és quem?
A irmã sorrindo e eu: Sou o filho dela.

Ela chega, finalmente a uma conclusão de quem sou: Então tu és o Luiz?!

sábado, 12 de julho de 2014

Liguei a TV e estava dando uma reportagem que me interessou. Luciano Huck e Ronaldo Fofômeno no meio da floresta amazônica com alguns índios. Um cara da FUNAI falou mal de alguns missionários evangélicos que tentam "evangelizar" aquela tribo isolada. Ele falou que os evangélicos trazem doenças e a morte aos índios! ADOREI isso. Normal, história antiga!!! Religião, historicamente, só traz o mal. As maiores guerras sempre são para provar que meu deus é melhor que o teu. O Luciano falou: "lá na civilização normal"... Se referindo a nossa civilização branca, invasora e assassina. Já me aborreci. Mas me tapei de ódio mesmo quando o fofômeno teve a brilhante ideia de apresentar uma bola de futebol para os índios. Mas que débil mental, levando outro vírus da nossa cultura para a deles!!! Os arrogantes da "civilização normal" sempre tentando "ensinar" os índios. Então, vocês imaginem a minha alegria, o meu prazer inenarrável, quase tive um orgasmo, quando os índios acharam um bom uso para a bola: colocaram num montinho e todos, ao mesmo tempo, flecharam a bola!!! Muito gozo, júbilo e regozijo, a civilização anormal ainda vai salvar a humanidade da sua própria soberba!!!

sexta-feira, 4 de julho de 2014

Neymar sai da copa
Curioso. Esporte é saúde, mas tem médico e ambulância no lugar e as pessoas saem de maca gritando de dor. Esporte é lealdade, mas tem quatro juízes em campo e ainda assim sai violência. Esporte ensina a seguir regras, mas mesmo sendo filmados as pessoas tentam burlá-la. Esporte ensina a trabalhar em conjunto, mas só se for para destruir o trabalho alheio. Esporte é camaradagem, mas as torcidas tem que ser separadas com grades e a saída é por portões diferentes e com polícia montada em cavalos para impedir que se vejam. Esporte é inclusão, mas os campeonatos começam com 32 e TEM que excluir todos menos um antes do fim. Esporte é inclusão mas 22 jogam e milhões só assistem via satélite e, claro, se tu fores uma elite privilegiada, podes comprar um ingresso e ter direito a ser excluído in loco! Esporte afasta das drogas, mas todos os praticantes consomem drogas para não ter dor!! Como dizia uma música dos Replicantes, banda de punk rock da minha adolescência: "Eles querem me fazer acreditar!" Para mim, o rei está nu. Esse debate é antigo na Educação Física acadêmica, mas todos os argumentos a favor do esporte não me convencem. Um outro mundo é possível. Os esportes foram inventados num momento histórico que já passou, com uma função social que já é politicamente incorreta. Só o que o mantém na mídia são os interesses econômicos... inclusive da própria mídia.