domingo, 4 de janeiro de 2015

Qualquer viciado sofre. A gente tem que tentar compreender e ajudar o miserável. Eu, por exemplo, viciado desde piá. Sim, é verdade. Comecei com doses pequenas ainda criança. Meus próprios pais me ofereciam a droga achando até que estavam me fazendo um bem. Eles gostavam de me ver alegre. Até em festinhas infantis eu tinha acesso a droga, que aliás rolava à vontade sobre as mesas e dentro de tudo que é copo. Uma triste visão, agora me dou conta, mas é tarde. Na adolescência eu saia para as reuniões dançantes, na casa dos amigos ou em algum bar, mas sempre lá estava também, nalgum canto escuro passando de mão em mão, uma garrafa do meu vício que agora ficava mais e mais evidente. As doses foram aumentando conforme fui ficando mais velho. Parecia tudo muito divertido, todo mundo usava! Acreditem, mas tinha até propaganda na TV. A coisa saiu totalmente fora do meu controle quando comecei a trabalhar e podia comprar o quanto eu quisesse para me drogar, era barato. Eu tomava de litro... Gelada, quente, com gás, choca... Algumas vezes me vi de madrugada contando moedas ou procurando dinheiro em tudo que é bolso de calças na cesta de roupa suja para sair e procurar um posto de conveniência para me satisfazer. Muitas vezes entrei em vielas escuras, lugares desconhecidos ou qualquer inferninho atrás da dose salvadora. Agora já compro de fardo, para não ter perigo de faltar. Todo viciado sabe como é, somos solidários uns com os outros, não somos poucos. Vou entregar, agora todo mundo vai saber porque vou jogar a sujeira no ventilador. Mode “Foda-se”! Virei uma metralhadora giratória. Torça que até o fim desse texto eu não lembre de ti, porque eu sei que tu também és um dependente! Sim, tu mesmo que leste até aqui!!! Pensa que eu NÃO sou bobo? E não somos só nós!!! A dona do súper aqui da Barra não se flagrava que tinha um cliente especial, comprava uma quantidade ínfima para vender. Eu levava tudo na primeira semana!!! Reclamei e ela prometeu corrigir. Mesmo com a promessa fiquei duas semanas na seca. Desesperado na minha síndrome de abstinência, me vi obrigado a passar pelo ridículo de tomar Fanta!!! Todo dia eu ia no mercado e perguntava: E aí? Chegou? Uma hora, finalmente chegou! Pedi para a abastecedora ansioso e trêmulo: Me vê dois fardos de Coca Zero. A moça me olhou atônita, ficou muda. Eu repeti, agora ajudando com o gesto de paz e amor simbolizando quantos eu queria. Ela me perguntou, espantada: dois? É! Dois! Para se certificar ela ainda insiste: dois fardos? E eu, animado: Isso! Ainda sem acreditar ela pergunta uma última vez: tu queres dois fardos de Coca-Cola Zero 2 litros??? É!! Ela foi buscar, mas penalizada. Não podia acreditar que havia algum ser humano que sucumbisse a um vício de uma forma tão degradante... Compreendam, pessoal, eu também sou humano e sofro. Não me julguem, cada um tem seus vícios. Tu tomas café!!! E tu, chimarrão!!!

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