sexta-feira, 29 de julho de 2016

Meia fujona
No inverno, costumo dormir de meias. O curioso é que sempre acordo com um dos pés semi nu, a meia fica quase caindo. Quando percebi o fenômeno, achei que fosse o acaso. Mas não, todos os dias acontece. Engraçado como algumas coisas o cara só percebe depois de velho, ou, ainda não sei, só passam a ocorrer numa certa idade. O fato é que lá pelos trinta que comecei a me incomodar com a dúvida existencial do striptease de pé. Morava numa república de estudantes em Florianópolis, então imaginei o óbvio: meus colegas de apartamento vinham à noite para me pregar uma peça. Questionados, negaram veementemente, claro, com uma cara séria. Mas eu tinha certeza, eles riam muito assim que eu saia de casa. Porém, quando mudei para morar sozinho, essa hipótese foi rejeitada, pois um dos calcanhares continuava a acordar pelado. Será que tenho um dos pés calorento que habilidosamente se auto despe de madrugada? Ou o outro que é sacana e tira a meia do irmão? Como tenho formação científica, comecei a observar meticulosamente, formular hipóteses e até fazer alguns experimentos para descobrir as causas da bizarra e frequente ocorrência. Descartei as opções sobrenaturais. Não acho que seja um gnomo brincalhão que quer ver minha cara de dúvida ao acordar, nem meu anjo da guarda que coça minha canela. Me dei conta que só o pé esquerdo fica sem meia... Arrá!!! O movimento de rotação da terra e sua força de precessão vai arrancando a meia esquerda!!! Não, seria mais lento, como o afastamento dos continentes. Para a meia passar o calcanhar levaria algumas centenas de milênios. Hipótese descartada. Tem que ser uma coisa mais local, na cama. Eletricidade estática gerada pela fricção dos pés nas cobertas? Tá, mas e o outro pé? Também não. Então deve ser porque eu rolo na cama sempre para a direita e a meia vai saindo? Tentei umas três roladas e a meia fica firmona. Dez roladas, vinte, mas nada. Será que eu tenho movimentos involuntários frenéticos na perna esquerda? As companheiras que já dormiram comigo denunciariam, mas ninguém nunca reclamou de uma perna louca ou um dançarino de rock noturno. Mas recebi sugestões bem humoradas de uma namorada. Uma hipótese da sociologia, os pés teriam inclinações políticas: o esquerdo é revolucionário, naturista, o direito conservador, quer burca, claro! Outra hipótese da biologia: Um pé tem descendência indígena, não existe pecado ao sul do equador, o outro carrega os genes europeus e vem de cachecol. Os estudos continuam, mas a dúvida permanece. Hoje acordei de novo com o pé esquerdo quase sem meia e tive um insight: ele não tem pelos e a meia desliza num pé escorregadio! Diligente e em nome da ciência sentei rápido na cama, tirei as meias dos pés, até acendi a luz e comparei. Não, que desapontamento, os mesmos pelinhos que tem num, tem no outro. Mistério! Vou persistir na pesquisa. Não é porque ignoro as causas de um fenômeno natural que vou abdicar da razão. Se algum cientista quiser colaborar comigo, fique a vontade de contribuir.

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