segunda-feira, 11 de julho de 2016

Minha irmã do meio, Betânia, nasceu no último dia do ano. Quando aconteceu, muita gente aconselhou meus pais a registrá-la somente no outro dia, assim ela seria um ano mais nova. Ela é de meia sete e eu sou de somente um ano depois, comecinho de meia nove (ano de piadinhas maliciosas). Mas, nas datas de nascimento, parece que temos uma diferença maior. Somos da década de sessenta, de uma época de grandes transformações sociais. Sou da finaleira da década, mas me orgulho de ser daí e digo que sou de “meados dos anos sessenta”. Tudo bem, nasci no meio da fuzarca, ali é quando tudo estava acontecendo. Maio de 68 em Paris! Perdi por pouco! Eu diria que foi a pílula anticoncepcional o gatilho das revoluções. As mulheres passaram a poder fazer sexo casual como os homens, com vários parceiros, sem preocupações com uma possível gravidez. Mas há quem diga que foi a luta contra as guerras da Coréia e do Vietnam. O fato é que uma mudança brusca no modo de vida, nas relações sociais no mundo ocidental, ocorreu.
Alguém postou no facebook que Mercedes Sosa faria 77 anos hoje. Procurei “Gracias a La Vida” no Youtube e escutei. Me emocionei com a música e procurei outras que lembrei daquela época. Nossa, devia ser muito bacana ser adolescente ou adulto jovem nessa época! Os velhos deviam ficar apavorados enquanto nós crianças passivamente só assistíamos e aquilo para mim era o normal, a única vida que conhecia. Não só mudanças sociais ocorreram, mas tinha coisas muito boas surgindo na década de sessenta, além de eu, claro. No campo musical também foi um momento de virada. No mundo, Beatles, Rolling Stones, Simon and Garfunkel, Joan Baez, Bob Dilan, Janis Joplin. Aqui no Brasil, Caetano Veloso e Gilberto Gil inovavam com a Tropicália, Raul Seixas e Rita Lee arrebentando no rock. No Rio Grande do Sul os Almôndegas nos levantavam a autoestima. Imagina que loucura que era, cara!!! Cada letra legal, cada melodia inovadora, a esperança fantástica de um mundo mais justo. O Woodstock, as repúblicas dos estudantes, as comunidades hippies, a Mafalda, o Henfil, o ser humano na lua e o êxito socialista em alguns países. Nos anos setenta the dream was over. Eu nasci junto do AI-5. E minha infância e adolescência foi num momento muito duro do país, sombrio, de muita pobreza e desesperança, um momento da vitória das forças conservadoras de direita.
Betânia é um lugar, um vilarejo da antiga Judéia, um daqueles que Jesus perambulava com seus discípulos. Não tenho a menor idéia porque minha mãe escolheu o nome da criança homenageando um lugar. Vai ver era alguma passagem bíblica significativa para ela. Enquanto era vivo, os seguidores/aprendizes de Jesus eram chamados “discípulos”, mas depois de morto e ressucitado,  segundo a crença cristã, os discípulos viraram “apóstolos” ou enviados. Havia dois Tiagos entre os discípulos/apóstolos: Tiago, filho de Zebedeu e Tiago, Filho de Alfeu. Tenho certeza que foi por isso que minha mãe escolheu meu nome, era o nome mais comum entre os apóstolos! Só não me chamo Jesus mesmo porque um dos mandamentos da religião católica que ela seguia avisa para não dizer o nome de dels em vão. Acho que Bebel ficou com medo de uma hora ou outra escapar e gritar: Jesus, seu demônio!!!

Eu gosto de meu Tiago. Hoje em dia ninguém nem sabe que é da Bíblia, muito menos que tinha dois apóstolos com esse nome, tanto que a maioria dos Thiagos agora, tem um “H” socado no meio. O bom católico nem lê, porque se fosse ler, hoje em dia, com o conhecimento que temos, perceberia rapidamente as inúmeras contradições e mazelas do livro sagrado. Aqui na Barra me disseram que quem lê de Gênesis ao Apocalipse enlouquece... Claro, percebe a farsa. A numerologia diz que o H dá um equilíbrio a pessoa. Nasci no fim de uma era, durante a revolução cultural. Meus pais ainda escolheram nomes na Bíblia, sem “H”, tiveram vários filhos até surgir a pílula, era como se fazia na época. Minha vida teve início na turbulência da tormenta cultural onde os Chicos Buarques eram maravilhosamente poéticos e caçados exatamente por isso. Mas a geração do meu filho vive uma bonanza cultural e econômica. Temos somente um ou dois filhos. O socialismo sucumbiu a pressão do capital. A Mercedes Sosa já morreu. O Simon e o Garfunkel, se vivos, já são velhinhos. E as Bethânias e Thiagos que nascem tem um H socado no meio do nome e nem sabe mais o que é catolicismo... Bueno, nem tudo está perdido!

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