sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Mundo masculino

Cada ano de Parobé (fiz seis) tive uma (e somente uma) colega mulher diferente. Elas fingiam não ver nem ouvir nada, tentando ser o mais discretas possível. A gurizada, na maior parte do tempo, nem percebia elas ali mesmo, porque eram uns buchos quietos, como plantas, todas. Eles diziam e faziam tudo como se estivessem num vestiário da fábrica em que trabalhavam, geralmente as gargalhadas e coçando o saco. - Ah, não, daí eu cumi o cu daquela vagabunda, sem camisinha mesmo, azar, guspi no pau e soquei... Tudo isso acompanhado de toda a gestuália característica. Mas quando eles se lembravam da presença delas ali, as coitadas sofriam. Teve uma vez no terceiro ano, quando um professor faltou num dia de chuva, ficamos na sala contando causos, escrevendo e desenhando nas paredes e nas classes (sim, éramos nós) e debochando uns dos outros. Tudo aos risos e empurrões, derrubando tudo. A única que não ria de nada nunca era a nossa única colega. Um colega tirou o pau para fora das calças e botou a trouxa toda em cima da mesa na frente da guria. Ele disse: - Pode pegar, Cristina, não te envergonha, a gente sabe que tu nunca viu nada assim mesmo, pode pegar, experimenta, aproveita... A coitada da Cristina, não disse nada, não riu nem chorou, não fugiu, não se mostrou irritada ou amedrontada, não mudou um músculo da cara ou do corpo. Se manteve calma olhando para sua pasta embaixo da classe como sempre. Talvez tivesse uma arma na pasta, não sei. Pode parecer estranho, mas era uma turma que eu não via malícia nenhuma, muito engraçada, sincera, eles me faziam rir muito. Uma das colegas, a Margarida, que se formou comigo, encontrei anos depois. Eu e a mãe estávamos fazendo o rancho no Zaffari. Ao passar as compras pelo caixa ela era a operadora. Percebi que ela me reconheceu e torceu para que eu não a reconhecesse, mas também percebi que tanto eu como ela vimos que não tinha como evitar de nos falarmos. Ela constrangida de estar ali naquela posição servil, mal remunerada, tendo a mesma qualificação que eu. E eu constrangido de ostentar aquele opulento rancho de filinho da mamãe, sem nem precisar trabalhar, mesmo já tendo uma boa qualificação. É, eu gosto de iogurte de morango... Ela tinha sido demitida logo após a formatura, como estagiária era ótima, mas funcionária não servia. Procurou por um tempo, na área, depois desistiu. Nas empresas em que técnicos em mecânica são necessários o clima é o mesmo do nosso curso, só que nas empresas dá processo aquele papo de pau no cu. Pobre das colegas, por mais talento que tenham, são, no mínimo, desrespeitadas ali, no máximo, ignoradas.

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